12.07.2007

do quiosque salamano

O velho parasita deixa-se levar pela revoada intransigente que o conduz estrada abaixo, para os confins da aldeia obscura em que habita há setenta e tal anos.

Periclitante, arrasta-se entre pedras talhadas ao acaso da marreta, que limitam a congosta húmida e fria, calçada com granito persistente e escorregadio pelo uso.

O frio aperta, gela o nariz enquanto o bafo não o conforta. Deixa um leve ardor no respirar e deixa exalar um hálito fumegante que rápido se dissipa na folhagem despenteada que surge, mal Remoinhos termina.

O velho estafermo continua sem rumo na bruma que se põe e que o impede de ver o destino. Décadas depois de ter sido parido nessas paragens, "no mato, por entre feras e demónios", como tinha ouvido vezes sem conta a sua parideira ressentida, caminha para a morte, depois de atazanar a aldeia com as suas devassidões de mastro à mostra e de fornicações animalescas.

“Puta que pariu o velho!” Era a frase que andava de boca em boca nos últimos 15 anos, desde que caiu da cadeira em que se apoiava para aviar a égua. Desde lá, só o cajado lhe permite deambular, sem rumo e sem amor, pelas ruelas frígidas desse asilo de velhos que esperam a morte, na serra vazia.

“Que o diabo o carregue para de onde veio”, ouviu sair do quiosque Salamano, antes de se perder no caralho do nevoeiro.

“Que o diabo vos carregue comigo, cabrões lambe-cus!” disse nostálgico antes de se perder no manto branco.

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