6.22.2007

o domínio do delírio e da alucinação

Sinto em mim, neste momento, qualquer coisa de estranho, de perturbante...

A fantasia sobre alto, a regiões inacessíveis, em cavalgaduras valquirianas, para além das nuvens, a perder-se na penumbra do infinito. Vou seguindo, involuntariamente, trajectórias que não obedecem a regras ou traçados. As luzes do bom senso começam a extinguir-se.

Não ouvem? Não sentem o estropear dos ginetes, o guizalhar dos truões, as gargalhadas dos bobos, as arruaças dos estriões, o ruído das matracas, o grito estridente das trombetas, um clamor jazebândico de agressivos sons?


É o cortejo que surge!


Fez-se silêncio.

Não vêem? Abrem alas. Todos se dobram reverentes. Sobre tapeçarias de bizarras cores, avança a passos resolutos, na indumentária de cerimónia do advento do século de Quinhentos, uma dama altiva, de vestido branco, longas mangas perdidas, gola cingida sobre encaixe agaloado, capacete bordado a pérolas...


É sua Majestade a Loucura!


A fanfarra e o séquito debandaram...


Apenas a acompanha um homem baixo, cuja fisionomia me não é estranha, sem a sua gorra escura, nem a sua face vincada de traços firmes e vigoroso. Fitam-me, de relance, os seus olhos azuis que lembram oriem nortenha. Oculta-se atrás da figura esbelta da dama que avança. Pede atenção. A Loucura vai falar.

In Moniz, Egas (1948). O Domínio do Delírio e da Alucinação. Centenário do Hospital Miguel Bombarda - Antigo Hospital de Rilhafoles (1848-1948). p. 233.

6.20.2007

fast facts


A Troubled Beginning
Photograph by Karen Kasmauski

Just minutes old, a baby in Bangladesh faces an uncertain future. With a low birth weight by international standards—less than 2,500 grams, or about five and a half pounds (2.5 kilograms)— this baby is much more likely to get sick and to succumb to disease than a newborn of normal size. More than 50 percent of babies in Bangladesh start out underweight.

In National Geographic

6.12.2007

majulah singapura

Minúsculos e impotentes, deambulam sem rumo nas ruas oprimidas pelos altos prédios que impedem a brasa de crepitar na pele.

Assim acontece desde os saudosos tempos de Thomas Raffles, quando cá aportou para colonizar, domar e modernizar esses marginais bárbaros que impediam a ordem e o progresso.

Quase 200 anos depois Ramanathan rege com o mesmo perfil: domar, modernizar e colonizar a economia mundial, tentando impor alguma ordem no fernesim de gente ensimesmada que, tóxica, impede o olhar desviado daquele insano transeunte que insiste em mandriar.

Raios e metal colidem estridentes no turbilhão de sons partilhados pela maralha incógnita. É um barulho implacável o que se ouve a milhares de quilómetros e que dá à cidade uma áurea de insalubridade deprimente.

As entranhas revoltam-se com o manjar disponível em uma qualquer banca do comércio tradicional. Farfalhos e arranques impedem de saborear os viscerais petiscos a que temos acesso.

Nada distrai o estômago da entoação acre, da fragrância oleosa das iguarias exóticas que saúdam o viandante ingénuo nas artérias abismais, seguindo o rebanho atarefado rumo ao conforto da cadeira laboral.

É um mundo paralelo o do comum singapuriano, lançador profissional de rojões crepitantes em alturas do Deepavali.

É uma vida modernizada, colonizada e domada a do incógnito malaio que por cá sobrevive.

É uma existência ensurdecedora, alietória, impessoal, intransigente e categoricamente descompensada, a da Singapura global em que habitámos.