11.29.2005

Saudoso tasco

É com grande preocupação que escrevo este texto. Ao longo dos últimos anos temos vindo a perder um dos maiores icones nacionais, o tasco. Sim, aquele local de cheiro ácido, entranhado daquela imaculada imundice, em que pontas de cigarro pintavam o chão. O tasco do homem calvo, bigode farfalhudo e nariz vermelho, vestido com um avental que um dia tinha sido branco e que mostrava as marcas do seu esforço em preparar sandes de rojão. Gajos como eu, passamos a vida a ouvir falar desse local mitico onde os nossos pais e avós moldaram a sua virilidade e figado sob a força do vinho martelado. E agora, que me sinto homem suficiente para debater a politica raesense (tino um grande abraço) vejo-me vitima da gasolinização. Vá-se lá perceber estes tempos modernos que revolucionaram os hábitos e costumes portugueses. A ventoinha de pás verdes e aros de metal substituida por um ar acondicionado. As mesas quadradas que tantas cartas e dinheiro viram bater deram lugar a uma mesa alta e redonda sem o conforto das cadeiras de madeira tosca desgastada pela força do uso. O tasqueiro tirou o avental e vestiu um pólo cinza com letras laranjas.
Este lugar estranho, limpo e luminoso, remeteu o tasco português para os livros de história.
Espero com isto, que os jovens e adultos portugueses, quando se encontrarem na gasolineira mais próxima possam perceber que um dia existiu um lugar que eles podiam chamar seu.

Já somos uma banda larga!

Banda Larga para todos!

Estamos em desenvolvimento, somos agora três, LOSTSOUL, novo Team Member, chegou para postar!

11.28.2005

Pensamentos transviados

A todos vós meus irmãos, comunico que devido ao surto epidémico que está a assolar o mundo, este ano, na quadra natalícia, não haverá missa do Galo.

BENTO XVI (2005). Discurso domingueiro.

Vaticano: Plenos Pulmões e Pantufas PRADA.

11.25.2005

O Castelo de Noudar


O relâmpago flamejante na planície cerrada, surpreendia a solidão e dava alento para mais um dia no deserto de palavras que implicava a estada em tal latitude.

Pela manhã, os bons dias eram oferecidos a todos, por esvoaçantes que, sem receio, deambulavam pelas muralhas avulsas esquecidas de todos.

Alguém se havia lembrado delas, no início do século, pelo que havia sido classificada Monumento Nacional. A partir daí, abandonada, apenas o balir e o latido acompanhavam a lenta degradação das estruturas.

A população que encerrava, havia partido há muito, sem saudades do regresso, tal a lonjura da civilização. O motivo, diz-se, terá sido um epidemia que dizimou a população e que a fez procurar outras paragens.

Situado na terra de ninguém, entre Portugal e Espanha, era posse obrigatória para quem quisesse dominar a região, pelo que as batalhas sucederam-se, até à assinatura de paz em 1668. Bom, não terá sido bem assim, em 1894, a contenda entre os beligerantes, foi sanada por acordos carimbados a sangue, irmanando, para sempre, o que era de cada um.

O castelo, isolado, deixou de ser preciso, deixou de ter significado, pelo que o esquecimento natural de quem vive o dia a dia o tornou cada vez mais distante e inacessível.
Vive, actualmente, da sua paisagem, do isolamento, do peso do passado ainda por explorar. O ambiente sinistro marcado por fantasmas de outrora aí tombados, pairam errantes por entre o vento que gela os corpos à sua passagem.

A paisagem verdejante acalma o espírito, pintalgada de vida e de cheiros ondulantes, é toda ela dinâmica com a brisa que sopra, trazendo sons longínquos e imperceptíveis ao ouvido, mas reconhecidos por quebraram o silêncio avassalador que impregna o ar.

Num espaço esquecido, tudo é volátil, apesar do vento levar a mensagem da sua existência, a corrente de pensamento, longe de imaginar a sua existência, e de se dedicar a assuntos da memória, deixa-a escapar, até à ruína...

Assim vai o nosso património.


Fotografias gentilmente cedidas por Raquel Neves.

11.18.2005

Pausa por uns dias!

Rumo ao obscurantismo, cá vou de novo, voltarei em breve!

Chegado de Valhalla...



Chegado de Copenhaga, onde contrai, uma gripe, ou se não daí, talvez de uma rameira viciosa com quem me cruzei, "either way", aqui fica o principal foco de interesse desta minha curta estada em København, a Gliptoteca Ny Carlsberg, exacto, o da brewsky!

Depois de uma noite debatendo-me com os demónios gripais, lá ganho coragem para deambular pela cidade, e então, munido de um copo de café a ferver como única arma para enfrentar o monstro de 4 graus célsius, lá vou à Ny Carlsberg Glyptotek.

Nem de propósito, neste curto período em que me encontro em Copenhaga, está patente uma colecção de peças do período Amarna (Egipto), que por acaso é dos aspectos que mais me atrai na historia social e artística egípcia, por razões que poderei explanar noutra altura. Como tal fiquei encantado e com o dia ganho. Por outro lado, devido a obras, parte do museu está interdito obrigando a direcção à solução chamada "Gliptoteca compacta" exibindo as peças de maior relevo. Seja como for, fica aqui a impressão extremamente positiva de um museu excelente, com um espólio espectacular, do qual destaco a ala impressionista bem dotada de Manets, Gauguins e Rodins, para além das esculturas clássicas e pré-clássicas, Francesas e Dinamarquesas, aliás, a base do espólio dos Jacobsen (patronos) e razão do nome Gliptoteca (Colecção de Escultura).
Edifício espectacular, pessoal de simpatia extrema, muito agradável, a ver! ... Ni!

Novas entradas

Em viagens pelo mundo blogueiro, novas entradas de qualidade chegam ao nosso recanto mal amado.
1 entre 1000's é a face do Entetantuus, em movimento desde Julho de 2005. Na sua postada inicial, coloca algumas questões existenciais, logo respondendo-se com o seu mau feitio: será que vou ser uma ovelha negra nestas estradas cibernauticas???... Sinceramente não contem com isso, tenho mau génio mas nada incontrolável!
Cultossaurus, manietado por Raddagast, imberbe, dedica-se ao outro lado da arte, àquela obscura e indefinida, tantas vezes renegada pelos puristas, antes neo-academistas.
Ambos, a não perder!

11.17.2005

A vila

O ar rarefeito e frio dá vontade de abraçar os cobertores e de lá não sair. Cá fora, o ar cortante é a única companhia da vila deserta. De quando em vez um sussurro por entre o casario amontoado perturba o silêncio.

A casa, gélida como o exterior, vazia como as quingostas apertadas, oprime qualquer vontade criativa... Não apetece sair, nem entrar, passear ou relaxar, apetece apenas não estar, não fazer, partir e não voltar àquela terra maldita que a todos dá um ar taciturno e triste.

Cá fora, em tascos típicos mas limpos, a população, envelhecida, junta-se para falar sobre o breu que faz ou para contar o que já havia ouvido vezes sem conta. A praça da Liberdade, o centro quadrangular, está deserto, apenas da Associação Recreativa e do Café Central se ouve o difuso ruído de uma qualquer discussão em torno de velhos hábitos.

Pela manhã, o frio continua, as pessoas, activas na sua indolência, atarefam-se com o nada que têm para fazer.

Gente embrutecida e enfadada com o marasmo da vila, não tenta mexer ou mudar o que quer que seja, apenas ir vivendo, sem esperança no futuro, sem ambições excêntricas que as gentes da cidade têm, nem com vontade de mudar o mínimo pormenor da sua passagem já delineada, mesmo antes de nascer.

Aqui se sente a força do destino. A languidez domina as acções, tudo mexe de vagar tentando não alterar a ordem instituída. Caiadas de branco com lista inferior amarela, o casario idêntico define bem a forma de estar dos conterrâneos.

A paisagem tranquila e majestática, pintalgada por pontos esvoaçantes, faz-nos sentir a força do pensamento e da inércia de não querer deixar de a ver. Chaparros corajosos pontilham o solo, dando guarida aos poucos bovinos que se protegem das pingas verdejantes. A vida começa a despontar, após a manta tórrida que cobriu a paisagem durante a estiva.

Terra esquecida pelo país e pelos próprios habitantes, é um lugar de ninguém. Do país, longínquo, apenas ouvem falar das cidades, de uns tais bairros e aglomerados que nada têm a ver com a sua realidade caseira, ouvem algo sobre problemas sociais e crises existenciais que não se adaptam à sua verdade, essa de solidão e de sorriso difícil.

Realidades distintas estas do quadrado pequenino à beira mar plantado, farto em pensamento, parco em acções...

11.11.2005

Finalmente chegou a avó Micas

Chegou a avó Micas!

Mulher madura, de convicções fortes e contestatária, é uma mulher de outros tempos. Vem da longínqua Macondo, a terra da solidão empedernida que predestina uma vida lânguida e taciturna aos seus habitantes.

No corpo trás as marcas de outras batalhas, guerras entre mulheres à cata do melhor macho, aquele rechonchudo que dominava a aldeia.

É coxa. Conseguiu essa proeza ao encavalitar-se num escadote, tentando chegar às romãs luzidias que esperavam ser colhidas. Conseguiu, portanto, conciliar o seu nome com uma realidade: todas as Micas são coxas.

De facto assim é, coxeia ligeiramente pela fractura mal tratada e calcificada que lhe ficou, para sempre, como sinal de uma juventude de traquinices e de amores mal resolvidos, que lhe deram um olhar triste e um clamor constante por tempos que não voltam.

Outra das suas particularidades é a enigmática orelha ratada. Muito se conjectura sobre ela e muitas estórias circundam esse sinal. Uns dizem tratar-se de um sinal místico, colocado para marcar, para sempre, a figura maligna que a queriam ter feito, por cobiça... mas o seu temperamento dócil deitou por terra todas essas cochicharias.

Esse mesmo bom feitio foi alvo de outra teoria. Dizia-se que um dos seus inúmeros amantes, no calor da acção, terá arrancado parte da sua orelha. Mas nunca se viu um curativo, uma mazela recente no seu abanico.

A própria, em tempos, teorizou sobre isto, dizendo que se lembrava de, à nascença, em pleno berço, sonhar com a passeata de um roedor: levou-a a andar em carroceis fantásticos, quando nunca os tinha visto, e que lhe tinha oferecido um gelado dessa mesma máquina de fazer gelo que Melquíades havia trazido, muitas décadas antes, para outra povoação, com o mesmo nome, mas do outro lado da terra.

Nunca se soube que era feito do recorte que faltava, o que é certo é que ainda lá estão marcados como serra, dando-lhe um ar misterioso e estranhamente sensual, apesar da idade.

Noutros tempos foi elegante e esbelta. Assediada pelos jovens das aldeias vizinhas, acedia aos seus recônditos desejos, sem pudores e sem medos da condenação social que olhares invejosos lhe faziam.

Hoje, velha e encarquilhada, apenas os jovens lhe dirigem a palavra para ouvir a sua voz ritmada e trinante da experiência acumulada ao longo de muitos anos de tropelias sexuais. Rapazes filmam na memória as histórias, para mais tarde recordar no recanto do seu quarto, raparigas coram e fazem o mesmo, sem pudores, falando do seu corpo, das suas vontades e dos cuidados necessários à fornicação prolongada no tempo.

A avó Micas é assim, livre e vivida, como poucos conseguiram ser na aldeia que prendia vontades e soltava enxofres sedativos para tranquilizar os seus habitantes.

Está lá em casa, para animar as hostes!

11.09.2005

No comment

Espaços sob a égide do desejo

Alguém dotado intelectualmente, propunha, à tempos, a existência de padrões que dirigiam a vida das pessoas, como se uma espécie de predestinação cíclica deixasse antever uma conduta ou uma linha de actuação - pelo menos, assim entendi as suas palavras.

De facto, outras ideias emergem.

Quanto a mim, as referências são a base da existência humana. Somos o que comemos! Alguém dizia com autoridade.

De facto, assim é. São os referenciais que nos transformam no que realmente somos, não um ou outro acto, mas o conjunto de coisas que, ao rodear-nos, nos foram moldando, continuamente.

São elas que determinam o dia-a-dia social, mesmo que a justificação para actos não seja visível.

Esta problemática, actual, leva-nos a questões de fundo no que se refere à sociabilidade e à forma com a interacção grupal acontece.

Qual a fora correcta de agir em sociedade!? É uma questão sem resposta (daquelas a que um demagogo responderia: - Ainda bem que me faz essa pergunta!).

Apenas podemos dizer que todas são possíveis, desde que os desejos sejam realizados de forma sustentável, com a obrigatoridedade de ser intenção do indivíduo cumpri-lo e não deixá-lo no assento etéreo onde subiu!

É que há desejos, que ninguém quer destruir pela execução! Lá está, é Zenóbia!

Zenóbia

11.08.2005

Distraídos Ilustres

Tucherel esqueceu-se, um belo dia, do seu próprio nome.

Beethoven fazia demoradas excursões pelas florestas e frequentemente deixava lá a roupa.

Munster, tendo posto à sua porta um letreiro dizendo que o dono da casa estava ausente, deixou-se estar ali muito tempo à espera do seu próprio regresso.

Conta-se que Serpa Pimentel, chegando uma vez a casa molhado até aos ossos e com o guarda-chuva a escorrer, a primeira coisa que fez foi meter o guarda-chuva na cama!


António de Serpa Pimentel (Ministro da Fazenda e Finanças - 1879)

Assim acabámos a viagem pelo dito Almanaque, seleccionando um conjunto de notícias sobre individualidades distraídas.

O mote continua a ser o de divulgar informação humorística. O sentido de humor retorcido, como habitualmente, impera. Já a relevância científica deste manual é vital para a compreensão de uma época, tendo em atenção que, 88 anos depois, é o mote para pesquisas no mundo virtual sobre esta ou aquela personalidade.

É um livro preconizador que encontrarão por aí, em qualquer biblioteca do país, ex-assinante do Jornal O Primeiro de Janeiro para os anos de 1916 e 1917.


11.07.2005

Notas curiosas

No Almanaque do Primeiro de Janeiro de 1917, várias curiosidades pretendiam dar a este pequeno livro de bolso, o aspecto das revistas da Reader's Digest. Entre estas excentricidades, contavam-se as seguintes:

1 - Várias personagens nasceram com dentes, e entre eles:
- Guilherme Bigot, médico e filósofo francês do XVI século;
- Luís XIV, rei de França;
- O poeta inglês Boyd;
- Ricardo II, rei de Inglaterra;
- O grande orador Mirabeau
- E o cardeal Mazzarino.

2 - Entre 545 morfinómanos tratados pelo dr. Lacassagne, de Lyon, em França, 289 eram médicos.


Título: Mirabeau

11.06.2005

Pensamentos transviados

As crenças são como as cenouras... cada um faz com elas o que melhor lhe servir!

RATZINGER (2005). As minhas pantufas são PRADA. Vaticano: Ed. do Santíssimo, p. 2005.


11.04.2005

Os anões

Em leituras transviadas pelo Almanaque de O Primeiro de Janeiro para o ano de 1917, encontrei algumas preciosidades que nos falam do conceito retorcido de humor que, há época, imperava e da noção de conhecimento curioso que dominava uma sociedade ainda muito arreigada e comezinha.

Um desses casos é o artigo intitulado Os Anões...

Os mais notáveis anões dos tempos modernos têm sido:

O conde Borouloski, que era um polaco, nascido em 1739, de muito espírito, de elegantes maneiras, tinha de altura 90 centímetros.

Richebourg, um francês, que nasceu em 1768 e viveu 90 anos, morando em Paris com grande celebridade, tinha de altura 80 centímetros.

Thum Thumb, um americano, nascido em 1839 e casado com uma anã também americana. Ele tinha 85 cm. e ela 87.

Cha-Mah, um chinês, que floresceu de 1838 a 1868, tinha 81 cm.

Lucia Zaratti, uma americana, que se mostrou na Europa em 1873, bonita e admiravelmente proporcionada, tendo de altura 60 cm.

O general Mite, um americano, muito célebre que, depois de se expôr em toda a Europa, viva em Londres com grande luxo, tinha 67 cm. de altura.

Título: General Mite